Maio Laranja: Mês de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes

Para o presidente do Sinpofal, Eduardo Tavares, a realidade é triste e alarmante

“A exploração sexual infantil é uma triste e alarmante realidade no Brasil”. A constatação é do o presidente dos Sindicatos dos Policiais Federais no Estado de Alagoas (SINPOFAL), Eduardo Tavares. Os números mostram que, a cada 24 horas, 320 crianças e adolescentes são explorados sexualmente no território brasileiro. Contudo, esse número pode ser ainda maior, considerando que apenas 7 em cada 100 casos são denunciados, o que indica a necessidade de se falar mais sobre o assunto. 

Por isso, para entender melhor a dimensão desse problema e como combatê-lo, aprofundamos sobre assunto com Eduardo Tavares, que também é policial federal atuante na Superintendência Regional da Polícia Federal em Alagoas (SR/PF/AL). Na entrevista, ele também explica que não existe um modus operandi por parte dos abusadores sexuais: os métodos atravessam desde os mais simples aos mais complexos.  

Tavares também defende que as iniciativas de prevenção devem ser coletivas, englobando família, escola, poder público e sociedade geral e que é necessário educar com políticas inclusivas, efetiva punição e adição da temática no currículo escolar. 

O presidente do SINPOFAL também esclarece que os fatores sociais do Brasil são os maiores impulsores para a prática de crimes de violência sexual em crianças e adolescentes, como a pobreza e a desigualdade social, por exemplo. E também destaca que o sindicato está sempre atento a toda forma de combate aos crimes em que os policiais estão expostos diariamente. 

Confira a entrevista completa abaixo.

O abuso sexual de crianças e adolescentes é considerado pela Organização Mundial da Saúde como um problema mundial e de grandes proporções. Estima-se que a violência sexual atinja 12 milhões de pessoas a cada ano no mundo. As políticas públicas de enfrentamento adotadas no Brasil, em quase sua totalidade, têm foco na proteção da vítima. O senhor concorda que são insuficientes as iniciativas de prevenção e tratamento direcionadas ao abusador, de modo a evitar abusos ou impedir que se repitam?

São duas perguntas distintas e muito complexas: em relação às iniciativas de prevenção, estas são tratativas que devem ter resultados a longo prazo. As ações devem ser coletivas; um compromisso público, da família, da escola, da sociedade em geral. A conscientização na infância e adolescência é capaz de mudar concepções, com adultos mais perceptíveis e humanos no futuro. É preciso educar pensando nas próximas gerações, com políticas de inclusão da temática no currículo escolar, efetiva punição e políticas públicas constantes para combater ou pelo menos minimizar o alto índice de ocorrências deste mal que assola não só o Brasil, mas todo o mundo.

Em relação aos abusadores, existem aqueles em que a OMS os reconhece como possuidores de patologia específica, lhes garantindo o “status” de portador de transtorno mental, neste caso específico, seria um transtorno por opção sexual. Porém, é importante observar que a presença de um transtorno não implica automaticamente em ser o agente reconhecido como doente mental. O diagnóstico de um transtorno mental, incluindo a pedofilia, geralmente, é realizado por profissionais de saúde mental, como psicólogos ou psiquiatras, seguindo critérios específicos.

Vários estudiosos no mundo têm se debruçado para tentar entender a mente dessas pessoas que cometem esses abusos, sejam elas portadoras de transtorno ou não. 

 A título de conhecimento, existem vários casos em que os portadores desse transtorno pedem ajuda antes mesmo de cometer qualquer abuso. Procuram as autoridades e relatam o que estão sentindo, passando a receber imediatamente tratamento para conter os desejos relacionados à pornografia infantil.  Infelizmente é uma minoria. 

Um relatório de incidência de vitimização infantil praticada por infratores de pornografia infantil, divulgado em 2009, por Michael L. Bourke & Andres E. Hernandez: The ‘Butner Study’ Redux, analisa as características criminais e sociodemográficas do abusador sexual. Em base neste relatório, quais dinâmicas entre os agressores sexuais e as suas vítimas?

Não existe uma fórmula específica, um modus operandi “básico”. Vão das formas mais simples às mais complexas. No caso de crianças, até por estarem numa situação de vulnerabilidade maior que as demais pessoas, existem aqueles criminosos que adquirem brinquedos e guloseimas para atraí-las para seu ambiente, ou que se aproveitam do fato de serem  parentes e amigos da família,  que se colocam sempre “dispostos” a assumir responsabilidades pela criança, principalmente quando os pais têm que sair para trabalhar, bem como aqueles que se aproveitam das evoluções tecnológicas para se inserirem no mundo infantil “travestidos” de crianças ou adolescentes, utilizando softwares específicos para adquirir materialidade e, a partir daí, negociar esse material criminoso através de aplicativos de troca de mensagens de alta destruição. Alguns casos através da deep web, utilizando servidores localizados em vários países do mundo, onde, em alguns casos, as leis são mais tênues em relação aos crimes virtuais.    

Neste contexto, qual é o panorama da exploração sexual infantil no Brasil? Quais fatores contribuem para a prática deste crime?

No Brasil, embora seja difícil obter dados precisos, devido à natureza desse crime, que geralmente é praticado às escondidas, sabe-se que a exploração sexual infantil é uma triste e alarmante realidade. 

Os fatores sociais brasileiros são, por natureza, os maiores propulsores para a realidade desses crimes, incluindo a pobreza, a desigualdade social, a falta de acesso à educação de qualidade, violência doméstica, abandono familiar, tráfico de pessoas e impunidade. Crianças vulneráveis, como as de situações de rua, em situação de acolhimento institucional, ou que vivem em áreas de alta criminalidade, estão, particularmente, em maior risco.

É importante destacar que, hoje, as autoridades brasileiras tentam abraçar a causa do combate à pedofilia infantil. Juízes, Promotores de Justiça, Advocacia Pública, as polícias e demais instituições, estão, cada vez mais, “mergulhando” no combate a esse tipo de criminalidade, que realmente requer uma atenção especial.

 A Polícia Federal, em específico, investe na “capacitação de ponta” de seus policiais, resultando em um trabalho investigativo formidável, que desagua em operações de combate à pedofilia em todo Brasil, conduzindo milhares de criminosos à prisão. Hoje, a Polícia Federal tem seu trabalho reconhecido em todo mundo, tendo seu modelo investigativo copiado por vários países, inclusive europeus.  

Qual a diferença entre abuso e exploração?

Muitas pessoas não conseguem perceber a diferença em ambas as expressões.

O abuso está relacionado à ação ou omissão que cause danos físico, emocional, psicológico e, principalmente, sexual à criança.

Exploração remete-se, especificamente, à violência, que envolve a utilização de crianças para a lascívia, com fins financeiros, para a satisfazer as necessidades e desejos próprios ou de outrem. 

Existe relação entre pornografia e violência sexual?

É um tema muito controverso, pois há quem associe a pornografia ao desencadeamento de violência sexual, em determinado momento, fazendo um “link” de que não se chega à violência sexual sem passar pela pornografia, como uma influência. Não há consenso sobre o tema. 

No Brasil, apenas 10% dos casos de violência sexual são denunciados, essa realidade é ainda mais chocante quando há a comparação com o número de denúncias realizadas. Em 2021, por exemplo, o Disque 100 e o Ligue 180 registraram cerca de 102 mil denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes. Considerando estes dados, como combater a exploração no Brasil?

É um desafio para todos! Políticas públicas eficientes, projetos socais, endurecimento de penas, não permitir a impunidade, sobretudo para poderosos, investimento nos órgãos de segurança pública, cooperação entre as policiais, cooperação internacional e, também, o desenvolvimento de programas e software específicos voltados para a causa, são apenas algumas formas de potencializar o combate à exploração sexual infantil no Brasil.   

Segundo informações do Instituto de Medicina Legal (IML) de Maceió, catalogados e acompanhados pela Seprev, em 2021 foram registrados 173 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes, sendo 155 meninas e 18 meninos. Já em 2022, até o mês de abril, o IML de Maceió registrou 48 casos, sendo 44 meninas e quatro meninos. Quais ações realizadas pela PF em Alagoas?

Hoje em Alagoas, assim como em todas as unidades da Federação, existe uma delegacia específica para o combate à pornografia infantil, que disponibiliza policiais qualificados da instituição para enfrentar a problemática. Projeto que se repete em todas as Superintendências da Polícia Federal pelo país e que, ressalte-se, desenvolvem os trabalhos com maestria, tendo forte suporte de um setor específico e extremamente capacitado em Brasília, que é a mola propulsora dos serviços desenvolvidos em todo Brasil.

Qual a importância da educação sexual nas escolas para combater a exploração sexual infantil e como o sindicato observa essa pauta?

Comecei esta entrevista com este tema e é uma satisfação terminar com ele! Sempre acreditei que investir em educação de base é o caminho para enfrentar esta e outras mazelas que assolam o mundo. Comprovadamente, é na infância e adolescência que se cria concepção de cidadania. É uma responsabilidade conjunta do poder público, mediante políticas de enfrentamento eficientes e concretas de punição, da família, da escola e da sociedade em geral. O conhecimento vai trazer informação, vai formar caráter, gerar mudanças de comportamentos, alertando quanto à prevenção e consequentemente quanto à proteção a esta prática criminosa. 

O sindicato, enquanto instituição de classe, defende os interesses de seus filiados, e como trabalhamos na segurança pública, estamos sempre atentos a toda forma de combate aos crimes em que os policiais estão expostos todos os dias. Somos vigilantes, sobretudo na observância se políticas públicas de combate à criminalidade são bem empregadas. Contribuímos no desenvolvimento de projetos voltados à batalha contra criminosos e cobramos, veementemente, dos gestores, condições dignas de trabalho, sempre com o olhar voltado para a proteção dos policiais que, diuturnamente, dão a própria vida para defender os interesses da sociedade. São profissionais que têm que ser aplaudidos.

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