“Seu” Dominguinhos era um homem simples, calejado no trabalho, já passado dos setenta. Sua moradia, na saída de Arapiraca, era, também como ele, simples, porém aconchegante. Nos fundos da casa, há um terreno de algumas tarefas onde “seu” Domingos costumava enganar o tempo com alguns afazeres.
Fui à sua casa, acompanhado de seu filho, então Juiz de Direito em atividade, Dr. José Firmino de Oliveira, que até ali fora, como sempre fazia, dar, hoje já em desuso, a benção aos seus pais. Firmino, enquanto conversava com sua mãe, pediu-me que fosse olhar os cavalos, naquele terreno extenso, nos fundos da casa.
Fui caminhando até aquele local aprazível, observando cada planta, e antes de ver os cavalos manga larga, tão apreciados por todos nós em Arapiraca, visualizei “seu” Dominguinhos, sentado em uma cadeira, jogando alimentos aos pássaros que cantavam o canto alegre, onde natureza e vida se entrelaçavam no mistério da existência do mundo. Fiquei parado admirando e tocado por aquela cena. “ seu” Dominguinhos assoviava em atitude de completa satisfação. Era um homem pleno, realizado, em harmonia com a natureza e com Deus.
Perguntei, então, àquele homem, a mais tola das indagações: o que o senhor faz? a resposta, em sorriso ingênuo, surpreso com pergunta tão infantil, afirmou: “ensino esses pássaros a cantarem. Estão, cada vez mais estão cantando melhores” , arrematou. O seu assovio, pude perceber depois, era o de um homem que compreendia os pássaros e era compreendido por eles. Compreendia a natureza e era integrante dela. Grande lição. Grande aprendizado.
Essa história faz tempo. Esse homem educou seus filhos e os fez homens decentes e trabalhadores.
Eraldo, seu filho, homem de sorriso fácil e estrondosas gargalhadas, em Piranhas, quando seu irmão Dr. José Firmino, juiz de Direito, fora homenageado, contou a seguinte história: seu pai, o já mencionado Dominguinhos, o chamou e lhe deu a seguinte tarefa: Eraldo, meu filho, vá vigiar o galpão dos frangos. Leve esta espingarda. Está havendo roubo das aves. Eraldo, então de posse da arma, ia se retirando quando seu genitor lhe advertiu: “Eraldo, meu filho, se for um cidadão baixinho, de andar trôpego, e chapéu na cabeça, não atire. Por que pai, disse o apressado Eraldo. Não atire que deve ser o compadre Pedro, meu querido amigo, o ladrão.”
Sobre, ainda, a história dos frangos, Tarcizio Aureliano, amigo da família, conta: “Tarcizio, afirmava “seu” Domiguinhos, a melhor coisa do mundo é criar frangos. É negócio pra ficar rico”. Meses depois ele afirmava: “Tarcizio isto é negócio pra corno. Não quero mais saber de frangos. Quebra qualquer um”.
Ele era um típico homem nordestino. Carismático, alegre e bom. Sabia viver cada momento. Fazia da simples alegria contagiante da existência uma forma de vida.
Em cada filho sabia aonde havia chegado, na realização de sua existência.
Ao ensinar pássaros a cantarem, sabia entrar em sintonia com a natureza. Ao permitir que seus filhos aumentassem suas estórias, permitia-se amá-los e compreendê-los na harmonia da família.
“Seu” Dominguinhos reflete o homem do interior do Brasil. Acostumado às intempéries da vida, vivendo-a sem perder a fé e a esperança.
Certo dia Gilberto, grande rotariano, morto pelo vírus, acompanhado de Erivan, grande empresário de Arapiraca, foram à casa de “seu” Dominguinhos, olhar uns cavalos Manga Larga do Firmino, filho do Dominguinhos. Gilberto disse para o experiente cidadão: Trouxe aqui, “seu” Dominguinhos, este rapaz, o nome dele é Erivan. Quero ver se o senhor aprova para tratar dos cavalos. Não é preguiçoso. É trabalhador. O velho, experiente, passado na casca do angico, como se diz aqui no Nordeste, pediu para ver as mãos do Erivan. Ao ver as mãos sem calos, afirmou: “Este nunca tratou de cavalos. Este deve ser algum empresário. Nunca soube o que é trabalho braçal. Engane outro”.
Era assim “ seu” Dominguinhos, vivia as intempéries da vida com o espírito alegre do homem simples, satisfeito. Seus filhos sentem orgulho do pai que, quando vivo, viveu a luta, a alegria e a esperança.