Personagem da mitologia Grega, Pandora foi instrumento de vingança de Zeus contra os homens, e foi também a primeira mulher a viver entre eles na Terra. De Zeus recebeu uma caixa onde havia a guerra, a discórdia, o ódio, a inveja, as doenças do corpo e da alma, mas também a esperança. Curiosa, Pandora abriu a caixa, logo depois arrependida fechou-a. Era tarde, somente a esperança ficou presa. Para os otimistas é um bom sinal, apesar dos males espalhados mundo afora, a esperança estará sempre ali e isso os impede de desistir. Os pessimistas, no entanto, entendem que a esperança presa é indício de que a humanidade está sem saída, sem futuro.
Essa semana um consórcio internacional de jornalistas investigativos abriu a caixa das empresas offshore, na operação denominada Pandora papers.Mais de 11,9 milhões de documentos confidenciais foram vazados envolvendo autoridades públicas, artistas e empresários de 90 países. As empresas offshore são abertas por importantes escritórios de advocacia em lugares onde não há cobrança de impostos ou que praticam baixas alíquotas, conhecidos como paraísos fiscais, e que mantém em segredo seus beneficiários finais. Elas não possuem atividades reais, não têm funcionários nem estrutura física.
No Brasil, não é crime possuir offshore desde que ela seja declarada à Receita Federal. O que chama atenção na relação de brasileiros que aparecem na documentação analisada é que entre eles estão os 66 maiores devedores de impostos do país; o Ministro da Economia, Paulo Guedes e; o Presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
O desapreço da elite brasileira pelo Brasil é conhecido. Retira-se do país as riquezas produzidas pelos trabalhadores nacionais sem deixar as contribuições devidas, roubando dos brasileiros as condições para a construção de uma sociedade menos desigual. Mas no caso de Paulo Guedes e Campos Neto há um agravante. Está claro o conflito entre os interesses do país e os deles, e a permanência destes senhores no governo é um escárnio.
Membros do Conselho Monetário Nacional, cabe a eles fixar as diretrizes e normas da política cambial do país. Assim, enquanto a valorização do dólar impõe preços impossíveis de serem pagos para a maioria dos brasileiros, aumenta o capital das offshores. De 2019 pra cá o patrimônio do ministro Paulo Guedes, em sua empresa nas Ilhas Virgens Britânicas, cresceu em torno de 14 milhões de reais apenas pela variação do dólar.
Um outro exemplo claro desse conflito de interesses está na derrubada da possibilidade de taxar estas empresas que havia na reforma tributária em discussão no Congresso, ainda que o ministro não tenha atuação direta nisso. Na análise de Paulo Guedes “queriam pegar as offshores, começaram a complicar, ou tira ou simplifica… tira”. Para estes investidores é importante que a esperança da maioria permaneça presa.
Mas a esperança prisioneira somente tem lugar na mitologia. Mesmo no mercado de capitais ela está presente, ainda que não agrade a muitos e enfrente grandes obstáculos para nele permanecer. A esperança na Bolsa de Valores do Brasil atende pelo nome de FINAPOP – Programa de Financiamento Popular da Agricultura Familiar para Produção de Alimentos Saudáveis.
O FINAPOP foi idealizado pelo investidor Eduardo Moreira tendo como referência programas semelhantes existentes na Europa que reúnem investidores preocupados com o que seus recursos estão financiando. Os valores captados pelo programa brasileiro são revertidos para cooperativas produtoras de alimentos livres de agrotóxicos ligadas ao Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – MST.
A primeira operação injetou cerca de 1 milhão de reais numa cooperativa do Rio Grande do Sul, produtora de arroz orgânico e carne suína. A última, realizada em setembro desse ano, captou 17,5 milhões de reais e ampliará a capacidade de produção de 7 cooperativas do MST que produzem leite, milho, arroz, soja, açúcar mascavo e suco de laranja, nas regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste do Brasil.
A esperança na construção de um país melhor está revolucionando o mercado de títulos de renda fixa através dos Certificados de Recebíveis do Agronegócio – CRA, do MST, que oferece uma rentabilidade segura e acima dos ganhos da poupança, com aplicação mínima de 100 reais, na última operação. O FINAPOP reúne investidores e produtores conscientes de seu papel de cidadão e tem potencial para promover significativa mudança fundiária e econômica, além de manter fora dos cárceres a nossa confiança no Brasil e nos trabalhadores brasileiros.