POVO KRAUNÃ: DA SERRA ÀS MARGENS DO RIO OPARA

Por: Jorge Vieira – Jornalista

O Nordeste é indígena. Do ponto de vista da população local, parece uma constatação óbvia! Mas, na visão de historiadores e antropólogos de então, não era essa a compreensão. Por razões diferentes, os historiadores tratavam a realidade indígena como algo do passado; enquanto os antropólogos tinham a referência do silvícola amazônico. Nesse contexto, o indígena era um sujeito do passado e caracterizado como caboclo ou remanescente. E, portanto, com essa definição o Nordeste não tinha mais nativo.
A década de 1970 foi um marco. Enquanto a política indigenista oficial definia o indígena como o sujeito que devia ser integrado a comunhão nacional, o historiador belga Eduardo Hoornaert inverte a lógica e pergunta: “quem no Nordeste não é índio”? De 6 povos reconhecidos oficialmente (Pataxó hãhãhãe, Pankararu, Fulni-ô, Potiguara, Xucuru-Kariri e Xucuru-Kariri), emergiram vários outros reivindicando a identidade étnica e o direito ao território.
Em Alagoas, cada espaço percorrido do litoral ao sertão, a presença indígena está registrada na toponímia, culinária, pinturas rupestres, utensílios, ornamentações, músicas, religiões, celebrações, ou seja, em todas as expressões culturais materiais e imateriais. A vasta região sertaneja pernambucana e alagoana encontra-se as pegadas indígenas, onde não existiam limites para plantar, caçar e celebrar seus rituais.
Na década de 1980 surgiram os Wassu-Cocal, Jeripancó, Tingui-Botó e Karapoto, que foram registrados no livro-documentário resultado das pesquisas e registros fotográficos do antropólogo Clóvis Antunes, “Índios de Alagoas”. Na década seguinte, com a assessoria indigenista de Jorge Vieira, registrado no livro “Povos Indígenas”, foram reconhecidos Kalankó, Karuazu, Katokinn e Koiupanká. O povo Aconã foi desmembrado da etnia Tingui-Botó.
O grupo Kraunã, “ponta de rama” Pankararu, teve seus antepassados sofrendo o mesmo processo de desintegração que passaram todos os grupos originários do aldeamento Brejo dos Padres. Localizados na Serra Kraunã, município de Água Branca, lutaram pela terra com o movimento dos sem-terra, e acabaram conquistando um lote, atual aldeia Toá, nas margens do rio São Francisco.
A relação dos indígenas com o rio, por eles denominado Opara, é o lugar onde se encontra a ancestralidade. Como afirma Agamenon Kraunã: “Os espaços destinados aos rituais, como terreiros, santuários, cemitérios ancestrais, a reserva com as ervas medicinais que necessitam de proteção”
O que espera o povo Kraunâ, é a garantia de seus direitos, a demarcação do território, assistência em educação e saúde diferenciadas.