“Povos indígenas sofreram retrocesso de um século”

Povos indígenas sofrem retrocesso com política atual do Governo Federal – Foto: Adailson Calheiros

Os doze grupos indígenas existentes em Alagoas, algo em torno de 20 mil índios, estão com os processos de demarcação de terras paralisados pela União. No Dia Internacional dos Povos Indígenas, celebrado nesta terça-feira (9), a Tribuna Independente ouviu o indigenista Jorge Vieira para compreender o atual cenário de garantias de direitos dessa população. Segundo ele, o Governo Federal estabeleceu um retrocesso de um século na oferta de políticas públicas.

“Os povos indígenas sofreram um retrocesso de no mínimo um século com a política atual do presidente Jair Bolsonaro em todos os níveis e pontos de vista do órgão executor que é a Funai [Fundação Nacional do Índio]. A reforma administrativa dele tirou a Funai do Ministério da Justiça e colocou no Ministério da Agricultura, voltando aos moldes de 1910, colocando a raposa para cuidar de galinha, o Ministério da Agricultura sendo responsável pela demarcação de terras, colocando os fazendeiros para decidir sobre o futuro das terras indígenas”, pontua Vieira.

Conforme explica Jorge Vieira, que é membro do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e Coordenador do Núcleo Afro e Indígena (Nafri) do Cesmac, todos os processos envolvendo a demarcação de terras estão paralisados por diversos fatores, mas em todos os casos pela ineficiência das políticas.

“Aqui em Alagoas é o caso absoluto do descaso do ponto de vista de demarcação de terras. Todas as políticas foram paralisadas. É um retrocesso de um século objetivamente, essa política que vem sendo desenvolvida é o que foi aplicada em 1910, levando os índios ao extermínio, a ignorância completa das garantias dos direitos indígenas. Todos os povos precisam do processo de demarcação de terra, todos com sua especificidade. Existe um decreto que regulamenta isso, de 1996, que a primeira fase do processo de demarcação é a constituição de um grupo técnico, e tem povo indígena que nem o grupo foi criado. Em outro foi criado, apresentou relatório, e o relatório está nas gavetas de Brasília. Outro tramitou, que é o caso do Xucuru Kariri, e depois de vários relatórios está paralisado o processo, têm fases diferentes do processo, Kariri Xocó tá paralisado, e a União omissa, irresponsável, cumprindo o que o presidente disse que faria, que não iria demarcar nenhum milímetro de terra indígena, o órgão está descumprindo a Constituição e cumprindo os interesses ideológicos do presidente”, avalia.

“Descaso atinge também saúde e educação”, avalia indigenista

A falta de garantias se estende para outros aspectos da vida dos povos indígenas em Alagoas, de modo geral, afirma Jorge Vieira.

“Recentemente houve uma mobilização pela ineficiência da Funai na divisão dessa população. Tem sido um caos absoluto na demarcação de terras de territórios tradicionais. O descaso atinge diretamente as outras áreas: a questão da saúde indígena, que a Secretaria Nacional de Saúde Indígena que também é de competência a União”, destaca.

Em relação ao acesso à educação nas comunidades tradicionais, Jorge Vieira salienta que não há avanços no ensino específico desde a década de 1990, o que se reflete em situações como aulas embaixo de árvores ou em espaços improvisados.

“A educação é de responsabilidade do estado. Você encontra comunidades indígenas que desde a década de 1990 não têm escola indígena, para ter educação diferenciada. Então, também no estado passando por todos os governos, a educação indígena não avançou, não avançou o processo de uma educação especifico, e infelizmente ainda não existe um concurso público específico para áreas indígenas para atender esses povos de forma específica. Algumas comunidades indígenas estão precariamente dando aula debaixo de árvores, em casa doadas pela própria comunidade, pessoas saem da sua moradia para que os filhos tenham aula. É uma situação complicada. A única coisa que podemos destacar que é a Uneal que tem um programa de formação específica para professores indígenas. Mas se tem o professor, mas não tem o concurso, a escola e a estrutura. Em muitos casos as crianças estudam em escolas tradicionais, porque não tem escola na sua comunidade. Isso causa transtornos culturais, do ponto de vista da história e social, porque a criança corre risco nesse trajeto, aprende de forma descontextualizada”, defende. 

Fonte: Evellyn Pimentel com Tribuna Independente