Rei Negro visita Arapiraca durante temporada em Alagoas após 30 anos

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Obá Sobá José Mendes Gelejú Adelabú III, o rei negro brasileiro, esteve em Arapiraca durante sua visita ao estado de Alagoas, nesta sexta-feira (03). O rei nasceu na Serra da Barriga, na comunidade quilombola do Muquém, e deixou Alagoas ainda moço, rodou o mundo e morou por muitos anos na Nigéria, onde pode conhecer mais sobre a cultura africana e seus ancestrais.Desde então tem se dedicado ao estudo, à prática da religião e a manter o nome do seu trisavô Zumbi dos Palmares vivo.

O rei veio para Alagoas para participar das gravações do filme Zumbi dos Palmares do cineasta Lula de Oliveira. Também esteve na Serra da Barriga para as comemorações do Dia Nacional da Consciência Negra. À equipe do Jornal de Arapiraca, Mendes revelou que pretende passar a virada do ano em território alagoano para fazer o jogo de búzios do ano, mas adianta que precisa aguardar orientação dos orixás, para assim voltar para São Paulo onde fica localizado seu palácio. 

Após sair de Alagoas, o rei conheceu a África, onde ficou por mais de 15 anos e pôde ter contato com a cultura, costumes e religião. Estudou, se tornou doutor por Harvard, tem doutorado também em história africana e é sacerdote mor do candomblé no Brasil, reconhecido até pelo Papa Francisco. 

O motivo de ter saído de Alagoas: o preconceito. “Eu sai da minha terra porque eu era chutado pela minha sociedade, hoje eles perguntam ‘como ele é rei, tetraneto de Zumbi dos Palmares e não está aqui conosco?’ Ora, a cidade não me apoiou, nunca tive ajuda. Sofri muita perseguição, muito falatório sobre minha religião, que o candomblé era feitiçaria. Se dizem cultos mas não têm cultura. Daí fui pedir apoio no mundo inteiro e em todos países que eu fui, fui bem recebido,isso numa terra que eu não nasci”, comentou.

Durante a entrevista, o rei relembrou de momentos marcantes, como o ano em que através dos búzios cravou a eleição de Divaldo Suruagy no momento em que só seria nomeado aqueles escolhidos pelo regime militar. “Divaldo Suruagy foi um grande intelectual, todo livro que ele escrevia, ele me mandava o primeiro exemplar para corrigir, ele dizia que eu tinha descoberto ele. Lembro que fui convidado pela imprensa local e fiz o jogo do ano na praia de Paripueira. Naquela época só podia ser governador quem fosse nomeado pelo exército, na época da ditadura. O presidente era o Geisel. Me apresentaram todos os militares, eu fiz o jogo e nenhum foi justificado pelos búzios que são sagrados”, revelou.

Apesar de toda bagagem, o rei José Mendes se queixa da falta de reconhecimento no próprio estado de origem. “Eu vim preparado com tanta bagagem para dar ensino aos meus pais de santo, aos meus filhos e irmãos, mas não vi muitos. Ai eu me pergunto, que rei sou eu? Porque o nosso povo está totalmente desligado dos nossos costumes, dos nossos ensinamentos. A igreja católica tão unida, a evangélica tão unida, cheia de templos, quando vem um pastor, o outro vai aprender com eles e cadê a minha religião que eu não vejo, eu cheguei em Palmares e não fui tão bem recebido. Eu sendo filho da minha terra e não fui bem recebido. O que foi que eu fiz? porque eu não matei, não roubei, será que esse povo não reconhece um homem como eu?”, lamentou.

Após visitar os veículos de comunicação em Arapiraca, José Mendes seguiu para o município de Feira Grande, onde estava sendo aguardado pelos índios da tribo Tingui-botó. O Rei José Mendes cumprirá agenda em Alagoas até o próximo dia 1 de janeiro de 2022.

Fonte: Arapiraca News