Padre, eu?

*Manoel Ferreira Lira

    morrosanto@gmail.com

Brincadeira de amigos, em 2010, comemorando meu aniversário: Papa Abu XXVI 

A primeira vez ocorreu durante as eleições para a Prefeitura de Arapiraca, quando concorriam Severino Lúcio e Célia Rocha. Era delegado do partido PDS, que tinha Severino como postulante. No prédio da antiga revenda Cactus Veículos funcionava o comitê. Um dia, orientando jovens que queriam trabalhar para o candidato Severino, uma delas – jovem morena de uns 20 anos, não mais, olhou-me seriamente e disse, sem rodeios:

Padre, como posso agir, junto com minhas amigas, no dia da votação?

Padre, eu?!!!

Olhei, espantado para a jovem. Ora, eu não sou, nem nunca fui padre algum. Certamente ela estava me confundindo com alguém. Ou com algum padre arapiraquense. Esta, porém, não foi a primeira vez que me confundiam com um padre.  Ou mesmo olhavam-me e surgia à frente o rosto de um padre, ou coisa assim.

Uma das vezes, que me lembro, ou agora relembro: quando completei 60 anos, filhos e sobrinhos fizeram uma festa para homenagear aquela data. Foi na chácara de um compadre, amigo e concunhado, o Marcos Valença. Lá para as tantas, meus sobrinhos trouxeram vários paramentos (de padre), me vestiram e fizeram “desfilar” entre todos. Eu, à época, bebia e estava um pouco embriagado. Aceitei a brincadeira. Mas, brincadeira à parte, meus sobrinhos colocaram uma estola (paramento litúrgico) ao redor de meu pescoço.

Mas, padre, eu?

Uma outra vez, estava na capital da Bahia, com um primo (José Ivanildo), e os amigos Antônio Ferreira e Francisco Tavares, na esteira rolante do shopping Salvador, uma senhora ainda jovem fixou-me e disse: “A bênção, seu padre!”. Falou alto e muitos a ouviram. Imediatamente, sem pensar para agir, virei-me para ela e fiz o sinal da cruz. Foi instintivo. Abençoei. Mas, padre, eu?

Com amigos, na capital alagoana, também num shopping, o Maceió, uma tarde, outro movimento religioso: José Unaldo, o nosso Paparazzo, retirou de um envelope uma foto e me deu, dizendo: “É um presente de aniversário”. Foi num mês de dezembro. O presente foi esta foto aí, que ilustra estas memórias. Atrás estava escrito: “Papa Abu XXVI – Salve 26/12/2010. Lembranças de seus amigos Jal, Joracy, Tonho, Émerson, Paparazzo.”  

Papa, eu?

      Brincadeiras ou não, sou religioso, mas não tanto. Nas minhas famílias, Lira e Ferreira, não há quaisquer pessoas que chegaram a ser padres, muito menos papa. Na atualidade, não há notícia de padres; ninguém também vestiu batina ou hábito (pessoas pertencentes a uma ordem religiosa – monges, monjas, frades, freiras).

Fui às origens e encontrei um religioso na família Lira. Lá nos fins de 1600 e início de 1700, quando a família Mendes Lobato e Lyra, vindo de Portugal, emergiu pelo Rio São Francisco e foi se alojar no Rio de Baixo, em Porto da Folha, Sergipe. Depois, migrou para a região do Cariri, Ceará. O historiador cearense padre Antônio Gomes de Araújo referiu-se desta maneira sobre os Lira: “Sabemos que Antônio Mendes Lobatoe Lyra, Antônio Mendes Lobato e Lira e o Padre José Lobato do Espírito Santo e Manoel Rodrigues Ariosa foram os primeiros no Cariri. João Mendes Lobato e Lyra, filho de Antônio Mendes Lobato e Lyra, surge nas crônicas eclesiásticas de batizamento” (Lyra e Lira representam o mesmo Lira. Em alguns, mudava somente a grafia).

Alguns membros desta família chegaram ao Riacho Piaui, hoje povoado de Arapiraca, e, depois, enturmaram-se no Mocambo (hoje Feira Grande).

Desta forma, realmente, houve um padre na família. Naquelas eras. Mas, hoje não.

Padre, eu?

*Jornalista